Richard Zimler é um judeu laico, homossexual, nascido em Nova Iorque em 1956 e agora também portuense.
ENTREVISTA DE CARLOS VAZ MARQUES (2009)
A sua identidade judaica, de que já falámos, está presente em todos os seus romances; a sua identidade homossexual, embora de um modo mais discreto, também surge quase sempre.
Sim. Evidentemente, isso resulta, se calhar, da minha maneira de ser.
A minha questão é esta: pode-se dizer que é um autor de literatura gay?
Não, não sou. Para mim, ser um escritor gay implicava certas coisas: focar sempre essa temática, querer fazer parte daquele gueto. E eu não quero.
A literatura gay é um gueto?
Ainda é. Escrevo sobre a cultura judaica não porque ache que ela é mais importante ou mais interessante mas simplesmente porque esse é o meu pano de fundo e conheço-o bem.
Esse argumento não poderia ser usado por si também em relação à temática gay?
Talvez. Mas acho que ainda é diferente. A cultura judaica tem quatro mil anos de existência. A cultura gay ainda está em construção. E é uma construção um bocado artificial. Se, com estes livros, só conseguisse Ieitores judeus ficava deprimido. Porque acho que escrevo sobre as grandes questões da vida: sobre a identidade, morte, vida, amor, tudo isso. Para mim, o judaísmo é simplesmente uma porta pela qual posso entrar para falar de tudo. Se escrevesse um romance gay ‑ e já escrevi ‑ era igual.
Já escreveu um romance gay?
Não foi publicado em Portugal. Foi publicado nos Estados Unidos. Chama-se Unholy Ghosts.
É muito curioso que seja o seu único romance nunca editado em Portugal. Porque é que nunca o publicou cá?
Escrevi-o em 1996, falei com a minha editora portuguesa e ela pensou, nessa altura ‑ estamos a falar de 1996 ‑, que o romance era demasiado frontal.
Isso foi logo a seguir ao êxito de O Último Cabalista de Lisboa.
Foi. Enquanto O Último Cabalista de Lisboa estava a ser recusado pelos editores americanos ‑ houve vinte e quatro que recusaram publicar o livro ‑, naquele período de dois anos da minha depressão, escrevi esse outro livro. É sobre um jovem português, seropositivo, grande talento de guitarra clássica, com muitos problemas na sua família. Ele tem um professor americano de guitarra e o professor pensa: «Este jovem com tanto talento provavelmente vai morrer jovem, portanto é muito importante conseguir para ele o melhor professor possível, para que ele avance rapidamente, possa dar concertos e ter uma vida antes de morrer.» O livro é quase um road-movie. O professor americano, o jovem e o pai ‑ que está lá para o proteger ‑ vão de Lisboa para Madrid à procura de um professor super talentoso.
Onde é que o romance se torna um romance gay e muito frontal, como disse?
O jovem é gay e o professor é gay. O pai não é. Mas mesmo neste caso falo das grandes questões da vida e da morte. Curiosamente, há um ano fui contactado por uma senhora que quer fazer o seu doutoramento sobre esse livro.
Uma portuguesa?
Uma portuguesa. Está a traduzir o livro para português para fazer esse trabalho. Se calhar, depois disso a gente vai publicá-lo. Adoro esse livro.
Portanto, a razão para ele ainda não ter sido publicado não foi o Richard ter achado que ele não seria tão bom como os outros que escreveu.
Não. É um bom livro. Se calhar se o escrevesse hoje mudava algumas coisas. Mas é um bom livro. É muito frontal, não tem aqueles jogos latinos: nele as pessoas dizem o que pensam. Há cenas que são quase como Quem Tem Medo de Virgínia Woolf? Cenas de uma violência emocional muito forte. Não há violência física, mas a violência emocional entre aquelas três personagens é muito forte. Tem muito humor negro também. Já foi publicado em Itália.
Acha que é um livro que poderia chocar sensibilidades ainda hoje, em Portugal?
Não. Agora não chocava ninguém. Felizmente. Portugal mudou muito nos últimos 10 ou 15 anos.
Apesar de esse ser o seu único romance assumidamente gay há sempre um elemento ou outro nos seus livros em que essa sua identidade está presente. Fá-lo deliberadamente?
Para mim é nada mais, nada menos do que isto: homossexuais e lésbicas existem. Então, têm de fazer parte de qualquer história. Podem ser personagens centrais ou podem ser personagens periféricas. Não interessa. Mas os homossexuais faziam parte da vida do gueto de Varsóvia. Curiosamente, chegou uma altura em que me interroguei: «Bom, vou explorar isso ou não?» Depois, li um livro que é o diário de Mary Berg, uma jovem americana que vivia no gueto de Varsóvia. Ela sobreviveu. Vivia na zona mais chique do gueto. O gueto também tinha zonas piores e melhores. Ela vivia na Rua de Siena, comia bem e tinha uma vida o mais normal possível naquelas circunstâncias. Mary Berg descreve no diário um tio dela que é homossexual. Não utiliza esta palavra mas toda a gente da família sabe que ele tem um amante e tratam este tio de uma maneira normal. Ninguém fala da situação mas ela está lá. Então, disse para mim: «Vou pôr isto no livro porque isto também fazia parte do gueto.»
Há uma literatura gay?
Há. Embora ache que a cultura gay ‑ isto vai ser uma crítica – ainda não tem a maturidade suficiente para dar um passo em frente.
Porquê?
Digo isto porque vi muitos filmes gay, recentemente [Richard Zimler fez parte do júri do Queer Lisboa, o Festival de Cinema Gay e Lésbico], e muitos deles ainda focam o sexo. Sexo, sexo, sexo. As cenas de sexo ou são bem feitas ou são horríveis e estúpidas. Normalmente é isso que acontece.
Escrever sobre sexo também é um exercício de alto risco.
É muito difícil. Cenas de sexo em romances ‑ e às vezes nos filmes – são a parte mais seca de qualquer filme ou livro. Muito poucos escritores sabem escrever sobre sexo. Modéstia à parte, acho que tenho nos meus livros várias cenas de sexo bem escritas, bem desenvolvidas e inteligentes. Mas acho que isso é raro. O meu conselho para muitos jovens escritores é que evitem isso. A não ser que tenham coragem de escrever sobre sexo de uma maneira muito diferente daquilo que se vê nos filmes ou na televisão.
Isto vinha a propósito de dizer que a cultura gay ainda está em desenvolvimento.
Eles ainda falam de coisas que vi nos anos 1970. Há muitos escritores que ainda pensam que é muito chocante escrever uma cena de amor brutal entre dois homens numa casa de banho... Desculpa lá! Já vi isso tantas vezes. Já vivi isso em São Francisco. Isso já não choca ninguém, hoje em dia. Escrever só para chocar? Escrever para poder dizer «Vou fazer isto apesar de todos os preconceitos»? Para mim, isso é um sinal de imaturidade da literatura gay e da cultura gay. Entra-se numa livraria gay e a secção de pornografia e livros eróticos é enorme. A secção de verdadeira literatura é muito pequena.
Há algum autor de literatura gay que considere especialmente bom?
Diria que há autores de literatura que, por acaso, são gays. Ou que por acaso são judeus. Para mim, o rótulo não interessa. Ou é um bom livro ou é um mau livro. Ponto final. Digo, às vezes, que só os maus livros têm nacionalidade. Não quero que os meus livros tenham nacionalidade.
Richard Zimler, «Um americano no Porto» (extracto)
in revista LER nº 85, Novembro de 2009
in revista LER nº 85, Novembro de 2009
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RICHARD ZIMLER
Lisboa, Dom Quixote, 2011
(tradução de José Lima)
Parece haver uma tentativa de escrever para um público específico, o adolescente, o que à partida é um risco, talvez por não fazer sentido escrever para a adolescência; talvez porque escrever para o mais íntimo de nós não se compadeça com idades, géneros, sexualidades, credos, modos de pensar o humano. A partir de certa idade precisamos de estímulos que não se servem numa bandeja.
A tematização consentida da escrita, numa atitude engajada, preocupa-se demasiado em colocar no caminho do leitor um enredo de composição intrincada, mas fácil (reverberado em tantos textos e em muito filme reproduzido em tardes de domingo televisivo) no caso: a jovem portuguesa de 15 anos, que acompanha os pais na emigração para os EUA, que se dá mal com a mãe ‑ bruta e distante ‑, que tem um irmão mais novo que protege, que tem um amigo, muito amigo, brasileiro, gay e que é humilhado por um colega praticante de taekwondo, que fica órfã de pai ‑ muito carinhoso e complacente ‑, recebendo a mãe uma indemnização que dá para viverem quatro anos sem trabalhar. Teresa esforça-se por aprender o inglês, joga na equipa de basquete do colégio, escreve haikus com o amigo, muito amigo, que lhe dá a conhecer música clássica, pensa a dado momento no suicídio e, em consequência, põe o irmão em perigo e tudo acaba bem porque a vida é uma aprendizagem e as coisas más e os erros, etc, servem para nos fortalecer sobretudo se estivermos atentos e quem não passa por elas não cresce e...
Por tudo isto, importa pouco a agilidade da escrita, a marca da diferença de ser e estar dos dois personagens centrais da narrativa ou o registo de uma suposta espontaneidade adolescente.
Dóris Graça Dias, “Richard Zimler. Risco adolescente”
in Revista LER nº 104, Julho/Agosto 2011
in Revista LER nº 104, Julho/Agosto 2011
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